
19 de maio de 2019.
O amor de uns pelos outros. O amor na comunidade, amor que
se espalha no mundo. Coisa difícil. Amar como Jesus amou. Esse é o diferencial
no grupo dos discípulos dos seus discípulos. E não é para quando for possível. Amar
também no meio dos problemas e das adversidades. Um mandamento novo. O novo
mandamento.
Eu tinha chamado um grupo de amigos para ir à Última Ceia,
aquela ceia de Jesus com os discípulos, em Jerusalém. E fomos. Só que nos demos
mal. Entramos na sala errada. A gente estava procurando a cena da última ceia.
Jesus e os discípulos sentados à mesa, conversando, quem sabe cantando os
salmos, na maior união. Bom, entramos na sala errada.
Quando entramos, ainda vimos Judas saindo meio apressado e o
clima de desconfiança que ficou no ar. Jesus ficou só com os onze. É aqui
mesmo, pensamos. Aí, nos encostamos pela parede, meio de longe, na penumbra e
nos preparamos para curtir o clima da Última Ceia. Aos poucos, fomos nos
envolvendo na cena. O grupo estava exaltado. Ouvimos claramente um deles dizer:
”eu nunca confiei nesse cara... um desonesto, um descontente, sempre com o pé
atrás”. O mais novo, bem ao lado de Jesus, estava avisando: Jesus confirmou:
Judas é um traidor”. Aí o negócio pegou fogo: “Desgraçado! Eu bem que estava
desconfiado dele. Se eu pegar esse cara, eu acabo com ele”. Esse Jesus da cena
estava com a cara triste, sisuda e lamentou-se: “A gente faz o melhor, se doa,
se sacrifica, olha o resultado!.... Será que vale a pena?”. O outro ao lado de
Jesus, talvez fosse Pedro, falou em tom raivoso: “Agora, vou lhe dizer uma
coisa, Senhor. Eu já o tinha alertado. Esse Sinédrio de Jerusalém é uma
desgraça. Desde que nós chegamos, eles estão viajando os seus passos: é escriba
fazendo perguntas capciosas, é olheiro por todo canto, é soldado atrás de lhe
prender. Eu bem que lhe disse: não vamos pra festa desse ano, que o negócio
está feio pro seu lado. O senhor não quis me ouvir!”. E eu vou dizer mais uma
coisa: “Aqui tem cabra frouxo... vai correr da parada. Mas, eu lhe
garanto: eu estou do seu lado, eu dou
minha vida pra lhe defender”. Aí o tom de voz subiu mesmo, um vozerio forte, um
reclama, outro bate na mesa, misturou-se o ódio e o medo, o negócio ficou feio.
Aí a gente se deu conta: “estamos na cena errada. Aqui não é a última ceia de
Jesus, não”. Vamos embora.
Aí, saímos, de fininho, e nos sentamos na praça. Estava todo
mundo impactado por aquele clima de tensão, por aquele discurso de ódio que
encontramos naquela ceia... Um dos colegas comentou: “Não estou entendendo... Jesus estava
lá, os onze apóstolos, até Judas nós vimos saindo...” E outro: “eu vi logo que
tinha alguma coisa errada. Jesus nunca incentivou o ódio... não jogaria um
contra o outro. Tinha uma coisa errada, nesse ceia” O outro, em tom mais
tranquilo, disse: “Claro que Jesus sabia o que estava acontecendo ao seu redor.
Ele vinha avisando os discípulos. Ele também percebeu que Judas estava se
afastando do grupo, dando-lhe as costas, prestes a trai-lo abertamente. Mas,
não denunciou Judas, não o expôs ao grupo. E o tratou sempre com deferência, inclusive
lhe deu o primeiro pedaço de pão molhado no vinho”. E uma colega, que ainda estava
tremendo coitada foi dizendo: “E os
discípulos, mesmo inseguros e temerosos, não partiram para malhar Judas...
Jesus queria que o amor reinasse no seu grupo. Deu-lhes isso como mandamento.
Amarem-se uns aos outros. Como ele os amou. E ele os amou dando a vida por
eles, na cruz. O amor leva a gente ser paciente com o outro que está no erro e respeitosos com os que são mais fracos”. Aí ficamos
mesmo certos: tínhamos entrado na sala errada.
Guardando a mensagem
Jesus nos amou de verdade. Conviveu com a sua comunidade de
discípulos, ensinou-lhes o caminho de Deus, lavou os seus pés. Numa prova única
de amor, deu sua vida por eles. Na Ceia, celebrou essa entrega, no sacramento
do pão e do vinho. No Apocalipse, a comunidade de Jesus é comparada com a
esposa. Ela ama de verdade o seu esposo. Nós amamos Jesus. É esse amor que nos
reúne, que nos une ao seu redor. O amor fraterno se alimenta desse amor a
Jesus. No Livro dos Atos dos Apóstolos, está que Paulo e Barnabé saíram mundo
afora, no meio de muitas dificuldades, edificando comunidades cristãs. É o amor
a Jesus que funda a comunidade. É o amor a Jesus e aos irmãos que explica a
permanente entrega dos seus missionários. Esse amor vivido na comunidade
espalha-se para o mundo, marca os nossos
relacionamentos com os outros. Queremos ser irmãos e irmãs nesse mundo desigual.
Defendemos os irmãozinhos que estejam sofrendo pelo desemprego, pela solidão, pela
opressão, pela perda de seus direitos. Nosso amor nos leva a querer que todos
tenham oportunidade e futuro, por isso
defendemos os estudantes e a educação. Queremos construir fraternidade, num
mundo desigual, sem compactuar com a violência e a exploração. Trabalhamos para
combater o mal e para que o errado acerte o caminho. Num país marcado, hoje,
pela polarização e pelo incitamento ao ódio, queremos amar os outros como Jesus
nos amou.
Nisto todos conhecerão que vocês são
meus discípulos, se tiverem amor uns aos outros (Jo 13, 35)
Rezando a palavra
Senhor Jesus,
Na tua Ceia,
aprendemos a amar como tu nos amaste. Tu nos amaste, entregando-te por nós até
a morte de cruz, para o perdão dos nossos pecados. Por tua ressurreição, nos
dás vida nova, o dom do teu Espírito. E nos pediste para viver nesse amor. Amor
a ti e aos irmãos. Nossas comunidades hão de ser espaços de comunhão e
participação, lugar de crescimento do amor, sobretudo nas horas difíceis. Nós
somos irmãos, nos reconhecemos filhos amados de um único pai. Assim, rezamos
juntos: “Pai nosso”. Queremos que a tua paz esteja na vida de cada um, de cada
uma. Assim, em nossas celebrações nos comunicamos a paz com um abraço, antes da
comunhão. Esse amor que experimentamos na comunidade dos discípulos, na tua Igreja, é a energia para nossa luta diária,
para nossos compromissos nesta sociedade desigual. Nesse amor, já estamos
fazendo esse mundo melhor. Seja bendito o teu santo nome, hoje e sempre. Amém.
Vivendo a palavra
Novos gestos e atitudes surgem do seu renovado amor a Jesus
e à sua comunidade, a Igreja. Hoje, convido você a se aproximar de uma pessoa
desconhecida. É um irmão, uma irmã. Basta se aproximar com um coração de irmão,
no Senhor.
Pe. João Carlos Ribeiro
– 19.05.2019